domingo, 20 de julho de 2014

Moraes Moreira - Coisa Acesa (1982)

Esse disco é muito legal. Não é a toa que muito se falou nele, ou, pelo menos, das minha pesquisas, é o que mais pude achar referências de imprensa. Quando do seu lançamento, duas grandes reportagens foram publicadas, uma na revista Isto É e outra na Veja (a velha Veja). No final do post você pode dar uma espiada nelas. Sobre a música, como um todo, o que falar? Da minha parte, vou apenas frisar a qualidade da gravação, com ótimos músicos, e também frisar a qualidade das canções, bastante inventivas e "pra frente". De resto, já há idéias interessantes nos dois artigos.
Sendo assim, vamos ao que interessa ao nosso blog, as parcerias com Leminski. Ao todo, contém três canções, sendo o disco de Moraes com mais parcerias com Leminski. São elas: Baile No Meu Coração, Decote Pronunciado e Pernambuco "Meu". Dessas, a que mais gosto é a última. Trata-se de um frevo super tematizado, uma homenagem ao estado de Pernambuco. Aliás, não sou apenas eu que tem uma caída pela música. Veja o que escreve o crítico da Veja: "Na melhor delas, Pernambuco "Meu", fica evidente que a combinação entre a música leve e ensolarada de Moraes e a elaborada poesia de Leminski, forte em temperos concretistas, é uma achado original." Muito legal a lembrança do articulista, sobre a questão da junção de música e letra. O autor da revista Isto É também salientou tal característica, chegando a nomear as parcerias do disco de "simbiose perfeita" de música de letra. Se você quiser ver uma análise mais aprofundada de Pernambuco "Meu", você a encontrará nessa dissertação. A análise se baseia em conceitos do compositor, pesquisador e professor Luiz Tatit. Bom, acho que é isso.

Revista Veja, 06 de out. de 1982:

FREVO ROMÂNTICO – Em seu novo LP, COISA ACESA, Moraes Moreira prova que sua caixa de surpresas continua sortida. Descobrindo uma súbita empatia entre sua música e o trabalho do poeta paranaense Paulo Leminski – que depois de livros controvertidos, como Catatau, tornou-se letrista habitual nos LPs de Caetano Veloso e do grupo A Cor do Som -, entabulou uma explosiva parceria que rendeu mais de uma dezena de canções em esparsos encontros, gerou o novo sucesso de Ney Mato Grosso, Promessa Demais, tema da novela Paraíso, e três das faixas do novo disco. Na melhor delas, Pernambuco "Meu", fica evidente que a combinação entre a música leve e ensolarada de Moraes e a elaborada poesia de Leminski, forte em temperos concretistas, é uma achado original. "Foi Paixão à primeira vista", diverte-se Leminski, que dedicou ainda um bonito poema ao parceiro. "Logo que o conheci, senti que a amizade ia acabar em música", responde Moraes. Musicalmente, Pernambuco "Meu" é também uma espécie de resumo das idéias contidas no disco. Ainda fascinado pelo frevo mas disposto a não repetir fórmulas por simples conveniência, Moraes trocou o clima apoteótico de Festa do Interior pelo chamado "frevo-canção" – de andamento mais lento, rico em tons menores e, portanto, mais dolente – e por canções de um romantismo hoje pouco frequênte em sua obra. Em Marília, por exemplo, [...]
PONTO DE EQUILÍBRIO – São manobras como essa que garantem a Moraes Moreira o raro dom de fazer muito sucesso popular com canções ousadas e inovadoras, sem amargar as desventuras da vanguarda. É um ponto de equilíbrio que Caetano Veloso, por exemplo, só encontrou há três anos, quando passou a vender muitos discos. Mesmo sendo o melhor poeta da música popular brasileira, porém, Caetano, como Milton Nascimento, Gilberto Gil ou Chico Buarque, percorre uma rotina de canções inspiradas que lança a cada disco, reclama quando lhe cobram alquimias diferentes e assume a própria preguiça. Entre os compositores de muito sucesso e muito talento no país, Moraes é o único a combinar a inquietude de Arrigo Barnabé com o carisma de Simone. Vende mais de 150 000 cópias de cada um de seus LPs, lota ginásios pelo país e fornece punhados de êxitos a outros intérpretes. Mas preserva a vocação para o risco. Ao combinar os dois processos, ele detém, no momento, o posto de compositor de maior vitalidade da música brasileira.

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Revista Isto É, 29 de set., 1982